O senador Ivo Cassol (PP-RO) usou a tribuna na tarde de ontem para atacar o jornal Diário da Amazônia
O senador Ivo Cassol (PP-RO) usou a tribuna na tarde de ontem para atacar o jornal Diário da Amazônia, reclamando da matéria veiculada no último domingo (10), onde, com base em acórdão nº 610/2015 do Tribunal de Contas da União (TCU), foi citado que seu governo é responsável pela perda de R$ 613.281.961,24 relativos a obras de esgotamento sanitário e água tratada em Porto Velho.
Cassol citou que o acórdão do TCU o tira totalmente da responsabilidade. Aparentemente, o senador não leu direito a matéria do Diário, nem o acórdão do TCU, onde diz que os argumentos apresentados por ele não são suficientes para afastar a sua responsabilidade por todas as irregularidades constatadas.
Cassol até se livrou de algumas, mas, seu secretário de Planejamento na época, João Carlos Gonçalves Ribeiro, foi responsabilizado e multado por pelo menos cinco irregularidades, entre elas a ausência de projeto, a licitação direcionada para Andrade Gutierrez, e o sobrepreço.
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O secretário João Carlos é aquele que ganhou o apelido de “Dallas” na lista de propinas da Odebrecht. Nessa mesma lista, o apelido de Cassol era “Massaranduba”. Os dois estão sendo investigados no processo judicial da Operação Lava Jato.
Cassol (Massaranduba) e João (Dallas) teriam recebido R$ 3 milhões em propina da Odebrecht, conforme delação premiada do engenheiro Henrique Valadares, diretor da empresa. Cassol (Massaranduba) também teria recebido mais R$ 2 milhões em propina da Andrade Gutierrez, conforme denúncia do ex-diretor da empresa, Flávio David Barra.
A questão do sobrepreço está clara em diversos pontos do acórdão do TCU, como a página 49, onde o relator, ministro Bruno Dantas, destaca o efeito positivo da ação do Tribunal, “ao rechaçar a consolidação de um sobrepreço da ordem de R$ 120 milhões, o que representa cerca de 20% do valor do contrato”. Além disso, o TCU apontou sobrepreço de R$ 66.851.030,79 no orçamento base do empreendimento.
Na página 8 do acórdão do TCU, o relator afirma que “as deficiências do projeto, que na concorrência, em vez de ensejarem a anulação do procedimento licitatório, foram utilizadas como motivação para a solicitação de mais recursos para a União”. É nítido que, em vez de anular a licitação, como deveria ter feito, o governo Cassol pediu mais dinheiro para a obra, que não possuía projeto básico concluído.
Apesar de Ivo Cassol ter alegado, em sua defesa ao TCU, que um agente político dificilmente detectaria os problemas apontados, o relatório do Tribunal cita que, “de maneira diversa do que advoga o defendente”(Cassol, no caso) “era plenamente possível, mesmo sem possuir qualquer conhecimento técnico – e em razão do soberbo porte do empreendimento – ter ciência da incompletude do projeto levado à licitação”.
Em seu discurso, Ivo Cassol também afirmou que executou 68% das obras de água tratada em Porto Velho, e que, “por denúncias vazias as obras foram suspensas”. Ele só não explicou a razão de grande parte da cidade ainda não receber água tratada, se tanta coisa foi feita em seu governo.
Em estudo comparativo feito nas 100 maiores cidades do país, pelo Instituto Trata Brasil, Porto Velho está em penúltimo lugar no tratamento de água – oferecendo água tratada para apenas 32% de sua população, e em último lugar no tratamento de esgoto, com apenas 1,9% de tratamento de esgoto.
Enquanto Cassol ataca a imprensa, grande parte da população de Porto Velho continua sem água tratada e esgotamento sanitário. O Diário da Amazônia mostrou casos de pessoas que precisam andar quilômetros mais de uma vez por semana para conseguir água limpa, geralmente em torneiras de escolas. Algumas delas perguntaram no bolso de quem foi parar o dinheiro que escorreu pelo ralo no episódio de canos que foram enterrados, deixando parte do asfalto quebrado, e que não levam água a lugar nenhum.
O Diário da Amazônia mostrou, na reportagem de domingo, que devido a falhas cometidas pelo governo Cassol, moradores de Porto Velho não são atendidos com água tratada e esgotamento sanitário, apesar de a cidade ter recebido inicialmente R$ 407.287.509,19 milhões do governo federal, através do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Para completar, a Caerd está praticamente falida, sendo que a companhia poderia estar operando bem, se as obras tivessem sido executadas.
RELEMBRE O CASO
O acórdão nº 610/2015, do Tribunal de Contas da União (TCU), demonstra que R$ 120 milhões seriam garfados através de sobrepreço no governo Cassol, por isso foram suspensas as obras de água e esgoto em Porto Velho. Essa quantia representa mais de 20% do montante do valor contratual, que era de R$ 613.281.961,24. Com a paralisação dos serviços, cerca de R$ 180 milhões que já haviam sido pagos simplesmente escorreram pelo ralo, e a população da capital ficou sem esgotamento sanitário, sem atendimento de 100% de água tratada e com a Caerd praticamente falida.
A maior parte do dinheiro para o projeto básico e para as obras veio do governo federal: R$ 407.287.509,19 milhões, através do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O Estado entrou com contrapartida de R$ 143.119.699,43, o que resultou em R$ 550.407.208,62. O dinheiro seria mais do que suficiente, como pode ser facilmente calculado, mas o governo Cassol achou que o montante era pouco e elevou mais R$ 62.874.752,62, chegando aos R$ 613.281.961,24 e praticando o sobrepreço de R$ 120 milhões.
As obras deveriam ser executadas inicialmente pelo então prefeito Roberto Sobrinho (PT), mas o então governador Ivo Cassol (PP-RO) pediu que os serviços fossem repassados para o Estado. Os dois são adversários políticos e tiveram diversos embates, mas Cassol usou um argumento muito forte, dizendo que poderia salvar a Caerd se a companhia ficasse responsável pela rede de água e esgoto na capital. Para evitar a falência da empresa, Sobrinho concordou.
Após conseguir puxar para o Estado a responsabilidade da execução dos empreendimentos, o governo Cassol cometeu falhas grotescas, como formalizar o contrato com a empresa vencedora sem a apresentação do projeto básico concluído. É bom lembrar que foram destinados R$ 9 milhões para a elaboração desse projeto.
Outras graves irregularidades são apontadas pelo TCU, como restrição à competitividade da licitação decorrente de critérios inadequados de habilitação e julgamento; ausência de licitação autônoma para a aquisição de materiais e equipamentos de custo relevante e inadequação de aceitabilidade do preço global e inexistência de critérios de aceitabilidade de preços unitários.
Na ocasião, foram apresentados diversos alertas de que na história de Porto Velho dificilmente haveria outra chance de a capital receber esse volume de dinheiro para atender a população com esgoto e água tratada. Lideranças do PT também avisaram que havia coisa errada, porque o governo não encarregou a Caerd de executar as obras, que foram repassadas para a Secretaria de Estado do Planejamento e Coordenação Geral (Seplan). De acordo com o que foi dito na ocasião, a explicação seria simples: havia muitos petistas na companhia, e eles perceberiam as irregularidades e o sobrepreço.
Em relação à primeira falha gritante, não existência de projeto básico concluído, Ivo Cassol foi ouvido pelo TCU e seus argumentos foram considerados insuficientes para afastar a irregularidade constatada. A defesa do atual senador foram centradas nas alegações de que não teria participado ou interferido na elaboração do projeto e do orçamento da obra, e que as irregularidades dificilmente seriam detectadas por agente político.
O relatório aponta, ainda, a forma como o governo Cassol tentou justificar o gasto de mais dinheiro, o que resultou no sobrepreço de R$ 120 milhões. Menos de três meses após publicar a licitação para executar o empreendimento, foi pedido mais dinheiro ao governo federal. O Estado, que tinha o atual senador Ivo Cassol no comando, citou haver deficiências no projeto elaborado
‘Contudo, com a evolução da elaboração dos projetos, as peculiaridades locais quanto a topografia plana, ocasionaram no aprofundamento das redes coletoras e aumento no número de estações elevatórias, dentre outros, e os valores previamente estabelecidos e parametrizados pelo Diagnóstico, se demonstraram insuficientes, sendo necessário um investimento complementar de R$ 334.470.633,38 visando o atendimento de 75% do acesso ao serviço de coleta e tratamento de esgoto da cidade de Porto Velho, representado pelos Sistemas Norte e Sul’, alegou o governo Cassol em sua justificativa.
Em seguida o relatório do TCU especifica que as deficiências apontadas no projeto deveriam ter sido utilizadas para anular o processo licitatório, e não para pedir mais dinheiro para a execução da obra. Como se fosse pouco, três meses após assinar a ordem de serviço, o responsável assinou documento rescindindo o contrato firmado com a empresa projetista, sem que seu objetivo tivesse sido concluído, sendo que constava a informação da inexequibilidade do projeto inicial, que foi adotado na licitação para contratação da obra.
De acordo com o Tribunal de Contas da União, diante dos fatos está constatado que, de maneira diversa do que advogou Ivo Cassol, “era plenamente possível, mesmo sem possuir qualquer conhecimento técnico – e em razão do soberbo porte do empreendimento –, ter ciência da incompletude do projeto levado à licitação e que culminou com a assinatura do Contrato 083/PGE-2009, em valor superior a R$ 600 milhões”.
O relatório cita, ainda, que ao contrário do que Ivo Cassol tentou demonstrar, sua posição de absoluta ascendência hierárquica sobre os demais gestores estaduais permitia a obtenção de informações de diversas fontes, inclusive dos órgãos que repassavam os recursos, por isso o então governador deveria ter demonstrado conduta diferente da apresentada ao assinar documentos.
“Deveria o responsável ter determinado a anulação da Concorrência 009/09/CPLO/SUPEL/RO (proposta de preços) e da Concorrência 042/08/CPLO/SUPEL/RO (pré-qualificação), não firmando o Contrato 083/PGE/2009 e não emitindo ordem de serviço autorizando o início da obra, ou mesmo tê-la anulado, considerando a inexequibilidade do projeto inicial, tal como fora licitado”, prossegue o relatório.
Após o governo Cassol ter ficado sob suspeita em relação às obras, principalmente porque o sobrepreço de R$ 120 milhões coroava todas as irregularidades, o contrato para a execução do empreendimento foi rescindido. No governo Confúcio houve a tentativa de retomar o serviço, para que aproximadamente R$ 180 milhões já pagos não fossem perdidos, mas não foi possível. Devido à ausência de projeto básico completo, não se sabe onde foi instalada a tubulação, pois apesar de muitos quilômetros de ruas terem sido quebrados, em diversos pontos onde o asfalto foi danificado não foram encontrados canos.
Após Rondônia perder mais de R$ 600 milhões devido a falhas cometidas pelo governo Cassol, na Zona Leste de Porto Velho a aposentada Maria Neves, de 60 anos, precisa andar quilômetros para ter acesso a água tratada. Como a família mora no bairro Belvedere, distante dali, sem ajuda nenhuma ela precisa colocar galões e garrafas pet em uma carriola e passar por ruas esburacadas, enfrentando lama ou poeira até chegar à torneira de uma escola no bairro Jardim Santana.
“Venho buscar água porque preciso. Eu sou sozinha. É só eu e Deus. O único meio de conseguir água tratada é aqui”, explicou, especificando que faz essa espécie de maratona a cada cindo dias, há aproximadamente dois anos. Essa batalha não é enfrentada somente por ela. Toda a população do Jardim Santana só encontra água potável no colégio.
O desempregado Teodomiro da Silva se submeteu a uma cirurgia no pé e tem dificuldade para colocar o galão em uma bicicleta e ir até o local. “Para quem é saudável, tudo bem. Mas para mim é difícil. Não sei nem se é tratada essa água, mas aqui na escola é o único lugar que tem (água limpa). Desde o final de 2015 eu pego água aqui”, explicou, mostrando a torneira.
Já o autônomo Lourival Rodrigues anda dois quilômetros de sua casa até a escola, para conseguir água. Ele disse que faz isso há quatro, colocando dois galões na garupa de uma bicicleta.
Alguns moradores, inconformados, querem saber para onde está o dinheiro perdido no governo Cassol. A aposentada Maria Lima disse que para o bolso dela que não é. “Eu oro para Deus, para que esses ladrões sejam tirados do poder e seja colocada uma pessoa decente, que tenha responsabilidade para tomar conta dessa cidade. Ninguém recebe nada de benefício. A gente só paga e não recebe”, afirmou Maria Lima.
Na rua Daniela, bairro Aponiã, o asfalto cortado mostra que metros abaixo estão enterrados canos que deveriam levar água para as residências e para o comércio. As cenas se repetem em diversos outros bairros. O governo Cassol pagou R$ 180 milhões à empresa contratada para fazer o serviço, mas os canos estão secos. O dinheiro escorreu pelo ralo, a população está sem água e a Caerd praticamente falida. As obras da estação de abastecimento da Zona Sul ficaram mais de oito anos paradas. Apesar de terem sido gastos R$ 58 milhões não há previsão de quando começará a abastecer a população.
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